Sérgio Costa é um verdadeiro malabarista e temos, todos, de lhe tirar o chapéu. Ele, que se dizia e diz freneticamente independente. Ele, que fala mal do PSD “sem o desrespeitar”. Ele, que gosta de visitar todos os certames, e alguns deles muito especiais, rodeado dos homens e das máquinas partidárias. Aquelas máquinas que dizia desprezar e odiar, porque “pela Guarda” e “acima de qualquer partido”, só devia obediência aos Guardenses.
Mas a quem deve, o nosso presidente, obediência? Em Sernancelhe, na inauguração da 30ª Festa da Castanha, pudemos vê-lo confiante e sorridente. Sem os seus fiéis escudeiros (pelo que se vê nas imagens!), mas totalmente colado ao aparelho partidário do PSD, num claro statement político. Aí, nesse preciso contexto, romperam-se todos os protocolos. Bem assim, usou incrivelmente da palavra antes de Luís Montenegro, que assistiu, com cara de poucos amigos, ao seu habitual discurso vazio e cheio de lugares-comuns.
Serão meros detalhes? Talvez, dir-me-ão os mais crédulos. Contudo, a que se deveram aqueles holofotes, logo ali, naquele contexto? Afinal, tudo faz parte duma ilusão que depressa se desfez. Está bem viva a vontade insaciável de voltar. A vontade de ser do PSD e de voltar às amarras dos partidos, essas amarras pecaminosas e terríveis que corroem a política e que destruíram a Guarda que ele ia, sozinho, levantar.
Pois bem prega frei Tomás: para surpresa geral, passado um ano, os partidos já são bons outra vez, a política já não se faz sem eles, e até já não têm a sua assustadora sede em Lisboa – está tudo ali às portas de Viseu. Não se deveriam, pois, pedir justificações a quem de direito? Já estão assim?! Algo vai mal no Reino da Independência.
Este pequeno incidente pôs-me a pensar numa grande proeza que quase todos conhecemos e que me ficou para sempre na retina. Pois é dela que me servirei, com despudor, e por ter acabado bem, para formular uma atrevida tentativa de analogia.
No dia 15 de janeiro de 2009, um voo comercial de passageiros que iria de Nova Iorque para Charlotte, na Carolina do Norte, pousou nas águas do rio Hudson, ao largo de Manhattan, seis minutos após a descolagem. Desgraçadamente, enquanto ganhava altitude, o Airbus A320 atingiu um grupo de gansos-do-canadá e de imediato perdeu potência em ambos os motores.
Quando a tripulação, desesperada, constatou que a aeronave não poderia alcançar nenhum campo livre de aterragem, decidiu guiá-la para sul, encaminhando-a inacreditavelmente para o leito do rio. Sem outra alternativa, o avião pousou nas águas, numa amaragem forçada e inusitada, virtualmente intacto.
Logo após a milagrosa manobra de emergência, os 155 passageiros do avião, parcialmente submerso e a naufragar, saíram e foram resgatados por embarcações próximas. Toda a tripulação do voo 1549 foi mais tarde condecorada com a Medalha de Mestre da Guild of Air Pilots and Air Navigators. Na grande cerimónia, foi dito que “a aterragem de emergência e a evacuação da aeronave, sem a perda de nenhuma vida humana, foi uma conquista heroica e única da aviação”.
Agora, estimados leitores, as perguntas que não querem calar: neste nosso episódio político, quem serão os tripulantes deste “avião”? Quem será o líder dos passageiros? Quem ou o que serão os “gansos-do-canadá”? Que passageiros estarão dispostos a embarcar nesta viagem turbulenta? Quem tomará a decisão de ficar em terra firme e independente? Quantas serão as embarcações de resgate? Quem nelas irá?
Será que a amaragem forçada vai ter um final feliz?
A julgar pelo semblante de Montenegro, lá se vai o nosso raciocínio.
Antevejo um desastre.