O que afasta os jovens da nossa política local? Eis a pergunta que coloco a mim próprio tantas e tantas vezes. Enquanto jovem que sou e, em conversa com outros tantos como eu, chego sempre à mesma conclusão: tudo, ou quase tudo, nos passa ao lado. Desde os mecanismos participativos à atividade dos órgãos autárquicos eleitos, passando até pelas campanhas e atos eleitorais. Há quem pense que o presidente da Assembleia Municipal é um vereador (na Guarda é um pouco assim), há quem pense que o Presidente da Câmara manda na Assembleia Municipal e nas 43 freguesias (sintomático) e há ainda quem não faça a mínima ideia de para onde vão os votos dos três boletins que nos são apresentados nas eleições autárquicas. O que é isso, de método de Hondt? Um caso bicudo, tanto na hora de o explicar, como na hora de o entender.
Se queremos ter uma política municipal de juventude transformadora, acho que poderíamos começar por aqui. Que tal explicar aos jovens, massivamente, o nosso sistema político e eleitoral? O poder local deveria colocar-nos no centro da decisão, e não à margem. Jovens informados tomam decisões informadas, importando-se com aquilo que os rodeia e valorizando o peso dessas mesmas decisões. Na Guarda, não é isso que acontece. Já aqui escrevi sobre a participação aguerrida da juventude nas últimas autárquicas, e não quero contradizer-me. Fiquei com a ideia clara de que participaram mais jovens, até porque houve mais candidaturas e, pela primeira vez, uma independente. Contudo, em geral, o cenário continua a ser desanimador. Os mais novos não acreditam na Guarda e nos autarcas (aliás, desconhecem-nos); há um sentimento de fuga aos partidos e à ação política que, consequentemente, fica “capturada” décadas e décadas pelos mesmos protagonistas que secam tudo ao seu redor. Não encarem isto como uma crítica, porque é apenas a constatação de um facto. Ninguém se vincula a um fenómeno que desconhece totalmente ou em grande parte. Se os partidos e as juventudes partidárias não se abrirem mais à sociedade civil; se a Câmara Municipal continuar sem transmitir uma reunião camarária; se a Assembleia Municipal continuar a ter mais de cinco horas de transmissão fastidiosa e pouco dinâmica no YouTube; então estaremos condenados a uma discussão básica do nosso futuro, alicerçada no achismo e em meias verdades. Diariamente se decidem matérias que interessam a todos. Quantos as conhecem? Regularmente, há reuniões de Câmara. Ninguém as vê, porque o Município não quer. Não basta ler as parangonas dos jornais. É preciso o escrutínio que decorra do conhecimento total e absoluto dos assuntos! Somos mais de quarenta mil pessoas no concelho que se juntam aos milhares que estão noutras cidades do país e na diáspora. Quantas assistem às Assembleias Municipais? As primeiras vítimas desta realidade são os mais novos, que crescem alienados do que se cá passa e saem da Guarda para não mais voltar.
Para primeira nota, queria trazer aqui um assunto que, para mim, é aflitivo e desolador. Volvidos quase nove meses e tantas promessas depois, a montanha pariu um rato. Vale o que vale, mas é a minha convicção: estamos mesmo a andar para trás e vai ser este o triste fado dos próximos três anos – desorganização, jogadas políticas e exibicionismo barato. De facto, este executivo municipal só tem uma política pública, que assenta em três pilares: o beija mão, subjugando as coletividades à entrega, in loco, de chorudos cheques (que parecem uma grande novidade para quem olha à vista desarmada), provenientes de delegações de competências e maiores dotações do Governo, e não da bondade e mecenato de um benemérito; a inauguração, que é, quiçá, o pilar mais importante, porque assenta, não apenas no ato de inaugurar, mas sobretudo no de desdenhar daquilo que foi feito antes, tomando o que há de melhor por seu; e, finalmente, a turvação, porque se criou uma associação que servirá para receber, mais facilmente, donativos vários para a próxima campanha eleitoral e porque, com concursos “límpidos e transparentes”, se continuam a pejar os serviços camarários de membros dessa mesmíssima associação. Muito bem! Como diria o grande Zeca Afonso, “enchem as tulhas, bebem vinho novo e dançam a ronda no pinhal do rei”! Trabalhar Pela Guarda, sim, mas que seja trabalho bem remunerado, e logo pela Câmara Municipal! Paguemos, pois, o custo dos vampiros!
Já que estamos numa de contratação pública, devo dizer que fiquei verdadeiramente incrédulo, para não dizer banzado, com uma peripécia em particular, que prova tudo o que venho dizendo acima. Trata-se de uma aquisição de serviços para a produção de eventos no âmbito das festas da cidade, cujo procedimento escolhido foi… o ajuste direto! Que erro crasso! Que ignorância! Para quem não sabe, o ajuste direto é o procedimento em que a entidade adjudicante convida diretamente uma entidade à sua escolha para que esta apresente uma proposta (artigo 112.º, n.º 2 do Código dos Contratos Públicos, doravante CCP). Pode fundamentar-se no critério do valor e, neste caso, a lei estipula que, se estiverem em causa contratos de aquisição de serviços (é este o caso), pode ser o procedimento adotado até ao preço contratual de vinte mil euros (ora, nesta situação, o contrato passa dos cento e quarenta e nove mil, pelo que não seria por aqui). Resta-nos, então, passar para os artigos 23º e seguintes do CCP, que postulam critérios materiais. Ora, o ajuste direto, independentemente do valor do contrato a celebrar, pode ser também justificado na sequência de concursos públicos desertos; de procedimentos em que as propostas tenham sido excluídas; por motivos de urgência imperiosa; em aquisições para a prestação de serviços de telecomunicações; e, finalmente, em caso de exclusividade do prestador ou do fornecedor. Ora, aqui começam todos os nossos problemas. O Município da Guarda, enquanto entidade adjudicante, socorre-se do artigo 24.º, n.º 1, alínea e), subalínea ii) do CCP para fundamentar o recurso ao ajuste direto, alegando ainda ausência de recursos próprios. Como é que isto é possível, se o mesmo artigo 24º, no seu número 7, vem referir claramente que o ajuste direto com fundamento no disposto nessa subalínea ii) da alínea e) do n.º 1 só pode ser adotado quando não exista alternativa ou substituto razoável e quando a inexistência de concorrência não resulte de uma restrição desnecessária face aos aspetos do contrato a celebrar? Bem. Não tendo nada contra a empresa que vai prestar o serviço – primeiro, porque é da Guarda, e depois, porque não é isso que está aqui em questão – apraz-me apenas perguntar se isto tem alguma lógica, porque eu não consigo deslindá-la. Uma Câmara como a da Guarda, liderada por um autarca que anda nisto há quase dez anos, dá-se a estes erros de palmatória? Como?! Pior: é o próprio presidente da Câmara que falta à verdade descaradamente quando, aos microfones da comunicação social, afirma que “a empresa ganhou o concurso”. Que concurso? O que devia ter sido feito e não foi? Gravíssimo! Assustador! De facto, isto só acontece porque não há qualquer visão de longo prazo nem planeamento cultural para o verão que se avizinha. Adjudicam-se então as festas da cidade, às três pancadas, com um mês de antecedência, enquanto esperamos todos, regaladamente, pela nova política cultural.
Por último, queria felicitar um amigo que é também um dos atletas mais prestigiados da Guarda e da nossa região. O Alfredo Torres assinou contrato com o Madeira SAD (agora Marítimo), que milita na elite do nosso andebol, e é um exemplo de luta e perseverança que aqui saúdo. Podíamos ter muitos mais como ele: no andebol, no futsal, no voleibol e no basquetebol (masculino e feminino!). A Guarda devia apostar fortemente nas modalidades de pavilhão e lutar por afirmar projetos desportivos no panorama nacional (até porque é muito mais fácil fazê-lo nas modalidades do que no futebol). Infelizmente, não é o caso. Apesar de sermos capital de distrito, não somos capitais em nada.
Já de Celorico da Beira, que terá a Academia Distrital de Futebol, não podemos dizer a mesma coisa. Este é um projeto avaliado em quase milhão e meio de euros, que contempla construção de bancadas, campo de relva sintética, campo de futebol de praia, quatro gabinetes de trabalho, quatro balneários para jogadores, dois balneários para árbitros, ginásio, sala de formação, gabinete médico, e ainda um pavilhão desportivo para o futsal. Que façam bom proveito. Nós, aqui na Guarda, não precisamos rigorosamente nada dessas modernices!