Esta publicação não é um auto de transferência de competências

O verão já está a acabar, mas o que não vai acabar tão cedo é a paródia. À falta de trabalho digno de registo, resta ao município socorrer-se das redes sociais para dar a ideia de que anda muito ocupado a transformar o mundo. Basta abrir o Facebook e começam as cerimónias. Entre outras, são “quarenta e três” comícios “grátis” dum autarca que continua em plena campanha eleitoral por todas as freguesias, distribuindo, desta feita, o dinheiro habitual do orçamento municipal e do Estado, de todos nós, “atribuído” pelo Decreto-Lei n.º 57/2019, de 30 de abril, que concretiza a Lei n.º 50/2018.

Para quem não sabe, este decreto-lei, no seu preâmbulo, referia que “se pretende que as freguesias exerçam competências em domínios que hoje são atribuídos apenas por delegação legal, por vezes ao sabor de estratégias políticas meramente conjunturais. Ou seja, o Governo quis, com ele, aprofundar o princípio da descentralização administrativa, responsabilizando as freguesias e retirando também aos municípios o ascendente ou maior “poder” que possam sobre elas exercer, consoante lhes apeteça, na altura de atribuir competências e dinheiro a umas e a outras.

Não é só de agora, mas a verdade é que ainda não percebemos o teor da palavra transferência e a força, que vem de cima, e que emana desta nova realidade em termos de competências. É por isso que a equipa do executivo continua a ir de terra em terra, reunindo as populações, para que estas saibam quem é e quão generoso é o druida que lhes dá novos e fantásticos poderes. Não seria mais fácil reunir novamente todas as juntas (tal como foi feito em fevereiro) e dar-lhes, numa só cerimónia, num só dia, os preciosos cheques? A descentralização e a boa governação das freguesias estarão para sempre condicionadas pela agenda de um só indivíduo que haja decidido fazer política com diplomas aprovados em Conselho de Ministros? Até quando vão as freguesias ter de prestar vassalagem aos municípios? Foi essa, porventura, a conceção do legislador constituinte em 1976? Se perguntarmos a nós próprios como é que os nossos autarcas (que deviam ocupar o seu tempo com a governação), têm tantas horas para gastar em política, chegaremos rapidamente à derradeira conclusão de que elegemos bons políticos e maus governantes. Gente que trabalha para si, para se pavonear com a soberba de sempre, e não para promover a qualidade de vida dos outros.

Na Guarda não há projeto coletivo nem estratégia diferenciadora. A cidade está mais suja do que nunca e a situação é crítica. As soluções de fundo, apregoadas para este flagelo, onde estão? A revisão do Plano Diretor Municipal era para acabar em seis meses, fazendo assim face à “incúria de quem governava”, e já foi prontamente adiada por mais dezoito. As medidas para o centro histórico e outras áreas de reabilitação urbana e rural eram também para serem pensadas, para depois executar “como deve ser”, mas ainda não houve tempo para essas questões menores. Os passadiços, esses, ficaram apalavrados para o início do verão. Talvez do próximo? Ou para o de São Martinho? O desespero é tanto que até já vieram colocar o ónus dos adiamentos da obra nos incêndios! Prometeram um milhão de árvores em quatro anos. Onde estão as primeiras, vamos supor, duzentas e cinquenta mil? A facilidade com que se falta à palavra aos guardenses é chocante (como é que conseguem?!) e pior será com a famosa variante dos F’s… prometida, à descarada, a sua execução em dois anos, já quase se passou um, e é mais uma promessa em maus lençóis. Uma de tantas e tantas outras, que seria por demais maçador estar aqui a enumerar exaustivamente. Quase tão maçador como o discurso novo e independente de quem foi 7 anos vereador e não é capaz de acrescentar rigorosamente nada no imediato. “Deixem-nos trabalhar!” “Não botem abaixo!” “Não matem as ideias!”, dizem os senhores, na varanda da altivez.

Pois eu digo-lhes: quando se voltarem a candidatar, tentem não gozar com a cara das pessoas.

P.S. Vivemos no reino da desinformação e é pelo dedo que se conhece o gigante. Quando não há uma comunicação social ativa e isenta, passa a valer tudo! A propaganda da Câmara afirma gastar-se um valor (125 mil euros) “três vezes superior aos anos anteriores” em vales para aquisição de livros de fichas e material escolar. Nas minhas contas, o triplo de 65 mil (verba de 2020) é 195 mil, e o triplo de 75 mil (verba de 2021), é 225 mil.

Neste regresso às aulas, dão um mau exemplo aos alunos do ensino básico. Não sabem sequer fazer um algoritmo de multiplicação.